Sexta-feira, 16 de Julho de 2010

Monólogos de Valium

"Onde se desliga? Onde é, que eu procuro e não acho? Não quero gente e não quero estar só. Não quero e quero. Quero e odeio. E esmago com as mãos. E magoo. Sangro, mas não há sangue. Onde se desliga que eu procuro, procuro, corro e revolvo o mundo? Já escavei com as minhas mãos quatro vezes o jardim e não encontro. Não há tesouro. Há loucura. Há uma tremura nas pernas e um formigueiro nos braços. A cabeça é um pêndulo de relógio. Onde se desliga? Esperar que acabe a pilha? E se eu não tiver tempo? Estás a dizer que o tempo para quando a pilha acabar? Eu devia ser um relógio de corda.

 

Onde se desliga? É triste formular e responder às minhas questões, como se eu as soubesse resolver. Está tudo no jardim, eu sei. Mas estou a escavar tudo outra vez e já não tenho mãos que aguentem… nem pernas que me segurem. Não encontro nada. Não sei onde desliga. E agora como faço? Já não há mais jardim para revolver. Daqui a pouco vão bater as horas… eu não suporto quando as horas batem… a cada uma, o pêndulo dá uma volta no meu pescoço. Está frio. Onde desliga? Alguém sabe onde desliga? Sabes? Sabes tu que sou eu onde desliga? Há grãos de areia maiores do que a minha alma e eu não sabia. Eu devia ser um relógio de corda. E depois pedia ao dia para a noite não me dar corda. Sem corda não havia tempo. Já viste como seria não sentir o corpo pesado a afundar-se no jardim?

 

Isto já não é um jardim. É uma trincheira. De um lado da barricada eu, do outro eu.  E eu a meio a levar com os estilhaços. Onde se desliga? Se ao menos viesse a noite e eu sem corda. Aposto que dormiria… e que alguém iria compor o jardim. Vou a escrever no comboio e os meus dedos são dispositivos desajeitados que se cansam por juntar as letras. Eles sem corda… quase defuntos do cansaço. É difícil alimentar todo o corpo para que se comporte bem. Se ao menos eu encontrasse o onde se desliga. Pobre jardim… lembras-te de como era bonito? Maldita neve de verão… e maldita esta procura que me obrigou a escavar todo o jardim três vezes… ou quatro? Cinco? Já não sei, tenho as mãos tão cansadas que até as unhas me moem a alma. Tenho uma mão cheia de poeira que é maior do que a minha alma. Onde se desliga. Daqui a pouco o computador sem bateria e eu ainda com corda.

 

Onde se desliga?

 

Quando acaba?

 

Não sou eu que sou louca, sabias? É a vida que me põe às voltas neste ópio. Tu sabes, porque tu eu e tu estas mãos cansadas de escavar à procura. É só mais um pequenino. Um copo de água e já está. Voa garganta abaixo e a corda acaba. E nesse rodopio narcótico já não há trincheira, há o jardim e há o botão."

 

Até amanhã, alma daninha.

música: Fix you - Coldplay
publicado por MB às 23:42
link | explanare | favorito
1 comentário:
De http://shakermaker.blogs.sapo.pt a 19 de Julho de 2010 às 23:35
Ora viva!

Bem, por onde é que eu hei de começar...
Oh MB, não sei o que dizer - o que em mim até estranho pois tenho opinião para tudo...
Talvez seja porque eu estive afastado e ainda não apanhei o jeito de volta. Sim, é isso.
Na verdade, este post deve ter muito para comentar, eu é que estou enferrujado.
Claro, é isso.

Volto noutro dia e levo no pensamento "a maldita neve de Verão". Eu já vi neve no Verão por isso nem tudo está perdido. Nem para si nem para mim.

Um abraço...
shakermaker

Comentar post

recentes scripta

Sibila est

Hipotermia (II)

Quarto de Pandora

António

Quiet Nights of Quiet Sta...

Catarse

RP sem Croquetes!

Por una Cabeza

Imortal

porta

Monólogos de Valium

Tardes de Saudade e um Ge...

...

Moinhos de Vento

Bilhete para o fim do dia

designed by Rui Barbosa