E a noite vai caindo, puxando as pálpebras de um sono branco de histórias. Sentaste no banco, desse lado, para ouvir os loucos que vivem nesta caixa sem paredes. Mas a noite vai caindo devagarinho, em pézinhos de lã, sorrateiramente e puxando o fio que fecha as pálpebras de um sono que já não sei que cor tem. Um repouso. Depois da longa conversa que tivemos. Eu, tu que passaste e paraste, e os loucos que vivem nesta caixa sem paredes. É reconfortante uma loucura quando é assistida. Obrigada por teres povoado a noite que teima em puxar para baixo as pálpebras de um sono que pinto em círculos concêntricos de cores estranhamente estranhas ao estranho.
Vês, por teres feito de conta que paravas, eu já faço de conta que estou melhor. Iludámos a realidade por um bocadinho e sentiremos que tudo o que existe é melhor , ainda que seja numa ilusão com data de validade. Não deixa de ser aliciante, de ser, quase, nefastamente atraente.
É o momento.
Em que eu me dou.
Em que tu te dás.
O banco fica no mesmo sítio. Senta-te sempre que quiseres ou sempre que achares que eu quero que te sentes. E não fales, não precisas. Dá-me, desse lado, a companhia do teu silêncio. Para eu continuar à espera e a ouvir o silêncio das palavras que não dizes. Senta-te sempre que passares por aqui. Pára só para parar. Não fales, mas pára. Não fales, mas lembra-te. Lembra-te. De parar e de assistir à minha loucura lúcida. Lembra-te de tirar uma fotografia para pôr no álbum das fotografias, daquelas que amarelecem e se rasgam e se dobram e se escondem em caixas, meticulosamente guardadas, ao lado de fios. Lembra-te de parar e pára para me lembrar. Antes ir de joelhos ao chão na Memória, do que cair no esquecimento.
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© Marta Barbosa 2007