Disse-me, noutro dia, o meu tio que este tempo de chuva é bom para os poetas. Começo a perceber porquê. Tanta água dá-nos um estado tal de melancolia que não dá vontade de fazer nada. Ficamos enovelados em nós próprios, à espera que venha o sol para dar um brilho renovador a tão cinzentas nuvens. E neste retiro de novelo ficamos a sós com os nossos pensamentos. Então, fervilha qualquer coisa cá dentro que nos puxa para o papel para escrever essa qualquer coisa que, mesmo sabendo o que é, insistimos em dizer que desconhecemos.
Contudo, não usando o papel, escrevo as minhas memórias (será que já as tenho?) no computador. Escrevo, escrevo, escrevo… Mas nada aparece no monitor. Às vezes não é a inspiração que falta, é a coragem para exteriorizar o que nos diz a inspiração. E como não sou capaz de estar em frente ao computador sem ouvir música, ponho-me a flutuar pelas melodias. E tanto flutuei esta tarde que fui bater contra a música Fragile do Sting. Nada melhor me podia ter acontecido. Começo a achar que o Sting e o meu querido Nuno Júdice comungam de algumas perspectivas. De facto, esta música encerra uma verdade tão grande como a Rússia, quem sabe maior. O ser humano é frágil.
Porque o último acto da nossa peça é sempre feito de fragilidades, porque o tempo não apaga as feridas da alma, porque a vida é diferente para todas as pessoas. Somos, provavelmente o animal mais poderoso, mas também o mais frágil. Seria tudo diferente (melhor?) se tivéssemos instintos em vez de sentimentos. O instinto obriga a abrigar da chuva, o sentimento faz-nos chover…
E, na sequência de tantas coisas que me aconteceram nos últimos tempos, posso dizer que estou melancólica, que me sinto frágil e que estou farta de ver a chuva a molhar-me.
Quero sol, quero ouvir o meu canto da cotovia…
Mas, enquanto não o ouço, ouço o Sting que também é bom…